Numa altura em que muito se fala da utilização de gases renováveis nas redes de gás natural, talvez devamos pensar nos utilizadores sem acesso às redes, como é o caso das áreas rurais e certas zonas urbanas, para além da utilização móvel do gás como fonte de energia final, seja nos transportes, na climatização ou no lazer.
O maior desafio da transição climática é assegurar que ninguém fica para trás, ou seja, que não se perpetuam ou aprofundam as desigualdades no acesso aos serviços e à utilização da energia nas suas diferentes utilizações. E é ao mesmo tempo um incentivo a que se pensem nas diferentes alternativas que existem ou se preparam para entrar no mercado, mobilizando a eficácia da sua adoção, não apenas no tempo útil para a sua implementação mas, igualmente importante, no custo de oportunidade que representam, muito mais baixo se pensarmos que várias delas permitem usar as infraestruturas existentes. Na verdade, a dimensão custo envolvida neste desiderato ambiental, convoca-nos para decisões difíceis mas também pragmáticas, para que o seu sucesso seja percebido e partilhado por todos.
Neste contexto, falar do mundo rural ou dos agregados dispersos e presentes em territórios de baixa densidade populacional (p.ex., áreas remotas e montanhosas), e que representam 83% da área total da UE mas onde vive ~31% da sua população (~130 milhões de pessoas), é um imperativo social e político, de modo a estarem contemplados nos projetos e soluções que assegurarão aquele caminho do desenvolvimento sustentável. O uso de energia comercial, industrial e agrícola em áreas rurais é marcado pelo facto de que é necessária muita energia em locais remotos. Nas aplicações agrícolas, o uso de energia também pode ser muito intenso por curtos períodos de tempo, como é o caso da secagem de culturas. Além disso, nas zonas rurais, 94,5% das habitações são casas unifamiliares que requerem mais energia para o aquecimento dos espaços.
Não parece assim que se previnam futuros problemas se se reduzir toda e qualquer solução, p.ex., em edifícios, à condição de “emissões zero” e “produção local totalmente assegurada por fontes de energia renovável” - a realidade desses agregados é muito diferenciada e devido às suas características térmicas deficientes, poderão enfrentar custos proibitivos para a geração de eletricidade para os seus sistemas térmicos. Milhões de casas rurais europeias ainda dependem de carvão ou do gasóleo (também conhecido como óleo de aquecimento) para o aquecimento dos ambientes. Uma mudança para o GPL, no curto prazo e mais tarde para o BioGPL proporcionaria uma redução imediata e substancial nas emissões e uma melhoria da qualidade do ar, com uma transição sustentável e suave.
Esquecer as potencialidades dos novos combustíveis renováveis como é o caso do BioGPL, é ignorar a sua intermutabilidade e estreitar de forma incompreensível o mix de ofertas que assim iriam beneficiar, antes de mais, aqueles consumidores. Um dos fatores determinantes para justificar a ponderação adequada das alternativas referidas, resulta da previsível pressão sobre a rede elétrica que resultará da rápida convergência para tornar a eletricidade, o serviço de energia dominante, com consequências na sua efetiva capacidade de resposta.
É preciso insistir com o facto de que os gases liquefeitos oferecem uma solução que reduz as emissões de CO2 e dos gases com efeito de estufa, em locais afastados ou não abrangidos pelas redes de distribuição, constituindo no curto prazo, a resposta disponível para mitigar os problemas ambientais e facilitar a transição energética.
Além disso, essa utilização, permite dispor do tempo e cria um incentivo adicional, para que se prossiga com a investigação e o desenvolvimento de novos combustíveis alternativos, compatíveis com as exigências crescentes colocadas pelo desafio das alterações climáticas, evitando os impactos das decisões radicais e disruptivas, e beneficiando da utilização de infraestruturas existentes. Este também um argumento importante para não colocar em causa o desenvolvimento futuro pela necessidade de investimentos avultados – podemos questionar-nos sobre o impacto no ambiente de deixar “ruínas tecnológicas” desta dimensão, com a sua desativação e inoperacionalidade e ao mesmo tempo pressionar os recursos do planeta para extrair as matérias primas que teriam de responder a todo um volume de construção que teria de responder a novos cenários.
No entanto, o que nos preocupa e merece a nossa atenção é a necessidade de dar uma resposta consistente, adequada e eficaz a todos os que estão longe dos grandes aglomerados populacionais e não têm acesso às redes de distribuição existentes e dificilmente terão, dado o elevado investimento que exige e que nunca foi economicamente viável, de modo a que se integrem neste movimento de mudança sem ficar para trás, por não terem condições para a ele aderir.
José Alberto Oliveira, Diretor Técnico, Apetro
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